sábado, 30 de outubro de 2010

Jeitos de Amar by Adélia Prado

Uma personagem põe-se a lembrar da mãe, que era
danada de braba, mas esmerava-se na hora de fazer
dois molhos de cachinhos no cabelo da filha, para
que ela fosse bonita pra escola.

"Meu Deus, quanto jeito que tem de ter amor".
É comovente porque é algo que a gente esquece:
milhões de pequenos gestos são maneiras de amar.
Beijos e abraços são provas mais eloqüentes,
exigem retribuição física, são facilidades do corpo.

Porém há diversos outras demonstrações mais sutis.
Mexer no cabelo, pentear os cabelos, tal como
aquela mãe e aquela filha, tal como namorados
fazem, tal como tanta gente faz: cafunés.
Amigas colorindo o cabelo da outra, cortando
franjas, puxando rabos de cavalo, rindo soltas.

Quanto jeito que há de amar.
Flores colhidas na calçada, flores compradas, flores
feitas de papel, desenhadas, entregues em datas
nada especiais: "lembrei de você".
É este o único e melhor motivo para azaléias,
margaridas, violetinhas.

Quanto jeito que há de amar.
Um telefonema pra saber da saúde, uma oferta de
carona, um elogio, um livro emprestado, uma carta
respondida, uma mensagem pelo celular, repartir o
que se tem, cuidados para não magoar, dizer a
verdade quando ela é salutar, e mentir, sim, com
carinho, se for para evitar feridas e dores desnecessárias.

Quanto jeito que há de amar.
Uma foto mantida ao alcance dos olhos, uma
lembrança bem guardada, fazer o prato predileto de
alguém e botar uma mesa bonita, levar o cachorro
pra passear, chamar pra ver a lua, dar banho em
quem não consegue fazê-lo só, ouvir os velhos,
ouvir as crianças, ouvir os amigos, ouvir os parentes, ouvir.

Quanto jeito que há de amar.
Orar por alguém, vestir roupa nova pra
homenagear, trocar curativos, tirar pra dançar, não
espalhar segredos, puxar o cobertor caído, cobrir,
visitar doentes, velar, sugerir cidades, filmes, cds,
brinquedos, brincar...

Quanto jeito que há.



quinta-feira, 14 de outubro de 2010

"Tudo o que chega, chega sempre por uma razão" by Fernando Pessoa

Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final..
Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver.
Foi despedida do trabalho?
Terminou uma relação?
Deixou a casa dos pais?
Você pode passar muito tempo se perguntando por que isso aconteceu.
Pode dizer para si mesma que não dará mais um passo enquanto não entender as razões que levaram certas coisas, que eram tão importantes e sólidas em sua vida, serem subitamente transformadas em pó.
Mas tal atitude será um desgaste imenso para todos: seus pais, seu marido ou sua esposa, seus amigos, seus filhos, sua irmã, todos estarão encerrando capítulos, virando a folha, seguindo adiante, e todos sofrerão ao ver que você está parado.
Ninguém pode estar ao mesmo tempo no presente e no passado, nem mesmo quando tentamos entender as coisas que acontecem conosco.
O que passou não voltará: não podemos ser eternamente meninos, adolescentes tardios, filhos que se sentem culpados ou rancorosos com os pais, amantes que revivem noite e dia uma ligação com quem já foi embora e não tem a menor intenção de voltar.
As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas realmente possam ir embora.
Por isso é tão importante (por mais doloroso que seja!) destruir recordações, mudar de casa, dar muitas coisas para orfanatos, vender ou doar os livros que tem.
Tudo neste mundo visível é uma manifestação do mundo invisível, do que está acontecendo em nosso .... e o desfazer-se de certas lembranças significa também abrir espaço para que outras tomem o seu lugar.
Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se.
Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos.
Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor.
Pare de ligar sua televisão emocional e assistir sempre ao mesmo programa, que mostra como você sofreu com determinada perda: isso o estará apenas envenenando, e nada mais.
Não há nada mais perigoso que rompimentos amorosos que não são aceitos, promessas de emprego que não têm data marcada para começar, decisões que sempre são adiadas em nome do "momento ideal".
Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará.
Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo, sem aquela pessoa - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade.
Pode parecer óbvio, pode mesmo ser difícil, mas é muito importante.
Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida.
Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem vc é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu própria, antes de conheceres alguém e de esperares que ele veja quem tu és
E lembra-te :

“Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão” (Fernando Pessoa)